v. 32 n. 64 (2017)

					Visualizar v. 32 n. 64 (2017)

Editorial

 

O lançamento de um novo número da Revista da Escola Superior de Guerra é um ato a ser comemorado por muitas razões, entre elas, o árduo caminho percorrido por um texto científico – da submissão do autor até a publicação e, no interregno, muitos diálogos entre os atores que fazem parte do processo: autor, editor, assistentes de revisão, revisor de normalização das referências, pareceristas, diagramador e outros; a partilha do trabalho intelectual, tão solitário, que, de repente, pode ser difundido com os leitores e expandido por meio de outras publicações. A publicação é o momento de marcar seu espaço de pesquisa e expor resultados de estudos e investigações, para debate público, concretizando o intuito maior da ciência: provocar diálogos consensuais ou controversos, sedimentados nos princípios e nos métodos científicos.

Este número inaugura uma nova periodicidade de nossa revista e a sua inserção no Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas, passos para que a Revista da Escola Superior de Guerra atenda aos critérios, às políticas e aos procedimentos de avaliação de periódicos científicos adotados pelo Projeto SciELO e, consequentemente, a admissão e a permanência de nosso periódico na coleção eletrônica SciELO Brasil.

            Este fascículo apresenta oito artigos que foram agrupados pelos pontos afins. O primeiro e o segundo artigo têm o papel do militar em momentos ápices da vida brasileira. O discurso acadêmico da primeira reflexão pode ser sintetizado no título poético O tinir de sabres na antessala: diplomacia e ação militar na questão do Acre, elaborado por Rosa Beatriz Madruga Pinheiro e Henrique Siniciato Terra Garbino, e fala sobre o comércio no mundo da borracha produzida nos seringais da Bacia Amazônica. Nesta época, uma leva de nordestinos, fugindo da seca, do desemprego e da falta de alimento, migra para o território do Acre, reconhecido como boliviano até 1903. Por um tempo, havia mais brasileiros que bolivianos, motivo gerador de uma tensão entre esses povos vizinhos, conhecida como Questão do Acre, considerada neste artigo como o período compreendido do Tratado de Ayacucho (1867) até o Tratado de Petrópolis (1903). Essa Questão “oferece exemplos claros da interdependência entre diplomacia e ação militar, bem como da articulação, inicialmente equivocada, dessas duas ferramentas da política externa.” O segundo estudo apresenta O papel do militar-estadista na construção do monopólio estatal do petróleo no Brasil, rubricado por Miguel Dhenin e Thiago Rodrigues. Retoma-se ao tema da luta dos militares nacionalistas em prol do monopólio estatal do petróleo que representava o progresso, a independência política, econômica e energética do país. O General Horta Barbosa esteve à frente de reuniões do Clube Militar, espaço de debates entre as diversas correntes. As reflexões advindas desses encontros redundaram na criação do Conselho Nacional do Petróleo.

            O terceiro artigo Estados Unidos, China e a geopolítica do petróleo no Atlântico Sul: uma análise sob a ótica da teoria dos complexos regionais de segurança, de Guilherme Sandoval Góes e Bruno Bahiense de Albuquerque e Silva, encontra-se com o segundo por meio do ouro negro, responsável pela cobiça e por muitas desavenças entre povos. O petróleo, como o principal combustível na matriz energética mundial, volta à cena nesta revista e no cenário econômico-político do Brasil. Ao contrário do que muitos anteviam sobre depleção das reservas globais para o início do século XXI, este século desperta com descobertas de enormes jazidas de petróleo no Atlântico Sul atraindo a cobiça especialmente dos Estados Unidos e da China, “ao mesmo tempo em que dinâmicas de securitização dessa fonte de energia desenvolvem-se em ambas as margens do Atlântico Sul”.

            O quarto e o quinto texto abordam assuntos diversos sob a ótica filosófica. O estudo As virtudes militares na pós-modernidade, subscrito por Igor Sidhartha Boëchat e Mark Imbeault, analisa a ética e as virtudes militares no mundo greco-latino e mostra as que ainda fazem sentido no universo pós-moderno. Aponta a necessidade dos militares das Forças Armadas confiarem nos valores que lhes são transmitidos para que estejam dispostos a lutar por causas que acreditam e que são relevantes para a paz no Brasil e no mundo. O quinto artigo A questão indígena brasileira: entre Jean-Jacques Rousseau e Auguste Comte, é posta em debate filosófico e antropológico por Flavio Costa Balod. Quando os “colonizadores- invasores” aqui chegaram, havia entre 5 a 6 milhões de índios livres, vivendo segundo seus hábitos e costumes milenares. Hoje, eles estão confinados a espaços denominados de terras indígenas. Mais ainda, muitas terras indígenas estão junto à faixa de fronteira o que pode colocar em risco, em termos, a soberania nacional. Velados ou revelados, interesses estrangeiros pela Amazônia e pelos recursos naturais situados em território dos nativos inquietam os que pensam a defesa dos interesses nacionais.

            O sexto artigo A inteligência geoespacial por satélites de interesse nacional do Brasil, fruto da reflexão de Bruno Martini auxiliado por Maria Célia Barbosa Reis da Silva, aborda o quanto a inteligência geoespacial ainda é pouco entendida, propagada e utilizada na maioria das nações. O texto acadêmico tece o conceito e o histórico dessa prática, suas proeminentes agências nacionais, “tipos e capacidades dessas plataformas orbitais em operação, armas antissatélites, satélites miniaturizados e infraestrutura em solo para consciência situacional da órbita da Terra”. O cenário internacional da inteligência geoespacial pode oportunizar a inserção do Brasil em lugares a serem explorados e preservados pelas Forças Armadas como o solo, mar e ar. Tanto o sexto quanto o sétimo texto centralizam seu ideário na inserção do Brasil e, por extensão da América do Sul, no cenário internacional.

UNASUR y el Consejo de Defensa Suramericano (CDS) en su primer lustro de funcionamiento 2011-2016, uma contribuição do estudioso chileno Gustavo Aimone Arredondo, vem ratificar a importância da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e do Conselho de Defesa Sul-Americano para a região. O texto proporciona uma visão do papel do Conselho de incentivar políticas de cooperação no setor de defesa, de mostrar que os sul-americanos são capazes de ombrear suas opiniões com as de grandes potências e entrar no cenário juntos para exibir nossa identidade, nossas tradições tão ricas e tantas vezes relegadas à posição não tão privilegiada. Gustavo ratifica o desejo de transformar a América “a América do Sul em uma Zona de Paz”.

Este fascículo acadêmico fecha-se com a aplicação dos estudos do militar prussiano Clausewitz no exame da Logística de Defesa do Brasil, no âmbito do século XXI. Daniel Mendes Aguiar Santos e Fábio Alexandro Dockhorn de Oliveira trazem, para Logística de Defesa do Brasil no primeiro quartel deste século, a trindade do notável guerreiro e teórico da guerra. O artigo – Clausewitz e a complexidade no século XXI: visitando opções para a logística de defesa no Brasil – expõe a influência do pensamento do militar e da complexidade do cenário conflitivo contemporâneo sobre a Logística de Defesa, tanto na esfera internacional, quanto doméstica.

Nota-se que autores renomados com grande capacidade de reflexão e de elevado conhecimento teórico dos campos em que atuam escrevem para nossa revista. Visitar, por meio da leitura, seus conhecimentos e suas descobertas é ser, de certa forma, um ator do mundo atual: tão rico em informações e, ao mesmo tempo, tão fragmentado. Esses artigos incentivam e convocam novos autores para participarem do luminoso caminho do saber.

Enviem sugestões para nossa revista, dialoguem pelo endereço eletrônico com nossos autores. Boa leitura!

Publicado: 20-03-2025

Artigos